Há muito tempo atrás, quando a analogia dominava a sociedade e a “presença digital” era um tópico futurista, as regras de convivência e etiqueta social eram explícitas, claras e simples. Hoje, no momento em que a interação humana, de forma generalizada, passa por transformação, quais são os guidelines de comportamento? Quem os dita? E até que ponto essas mudanças influenciam na relação dos universos profissional-pessoal?
As perguntas são inspiradas em uma discussão iniciada em um grupo do Facebook intitulado “Entusiastas da Social Media”, no qual profissionais de mídias sociais, comunicação, publicidade e propaganda dividem cases, crises, dúvidas e os micos mais cabeludos pagos por marcas na internet, figuras públicas e, obviamente, os próprios socials media.
A discussão, no caso, aconteceu a partir de um print publicado por um dos participantes, na qual era colocada a seguinte situação: um usuário do Twitter, que se candidata “abertamente” em seu perfil para uma vaga de emprego de mídias sociais, em uma empresa com presença online significativa, utiliza o mesmo espaço para publicar conteúdo agressivo, envolvendo-se em brigas e fazendo uso de palavreado pesado – o bom e velho palavrão. Isso afeta (ou deveria afetar) a contratação desse profissional?
Como em todo bom debate, as respostas foram conflitantes e bem argumentadas: de um lado, os que defendem a liberdade do profissional/candidato de se expressar da forma que lhe parecer mais confortável fora de seu ambiente de trabalho; do outro, os que acreditam que o conteúdo produzido por você na internet é seu cartão de visitas, revela quem você é e se você se enquadra no perfil da vaga/empresa.
A presença digital não é um quesito avaliativo utilizado por todo entrevistador, em toda empresa, para todas as áreas, já que é um conceito consideravelmente recente, e precisa de tempo para ser assimilado, como qualquer outro. Porém, principalmente nas áreas de comunicação, design, fotografia e arte, tem crescido, aparecido e evoluído. É o tão pedido portfólio online, que aos poucos divide a carga de importância das “experiências profissionais”. Divide, sim, pois com as novas demandas e necessidades criadas pela atuação online das marcas, surgem também novos cargos. E se hoje é possível contratar um jornalista ou um publicitário com experiência para cuidar de mídias sociais na sua empresa, há alguns anos o melhor cenário encontrado era um candidato com a tal da presença digital.
A supracitada presença digital não se refere apenas à criação de perfis nas redes mais badaladas do momento e o abandono da mesma alguns meses depois, mas a criação de conteúdo, compartilhamento de informação e a formação de uma rede de conexões diversificada e interessante. Exemplos fortes disso são os canais de vlog de personalidades como PC Siqueira e Felipe Neto, que por meio da publicação de vídeos, no qual expressam suas opiniões pessoais, conquistaram audiência, atenção, e por fim transformaram a prática em uma fonte de renda. Vale também citar os blogs Não Salvo e Pink Vader, gerenciados por Maurício “Cid” e Laura “Buu”, respectivamente, que começaram como uma iniciativa pessoal, e além de pão nosso de cada dia, viraram também referências para a “cultura da internet”.
E sabe o que todos os exemplos têm em comum? Você não vai encontrar conteúdo formal em nenhuma de suas redes pessoais. Levando mais além, no caso dos vloggers, o conteúdo é tão abarrotado de ofensas e palavrões, que como ser humano comum, prefiro levar o computador para longe da presença da minha mãe ao assistir os vídeos. Em resumo: são profissionais que conquistaram seu lugar no mercado trazendo a assinatura pessoal para o ambiente de trabalho, ignorando padrões “respeitáveis” de comportamento.
Porém, outra análise prioritária é a de ambiente. O PC Siqueira, por exemplo, passou a apresentar um programa no canal MTV, que é conhecido pela informalidade e a liberdade de linguajar. Levando em consideração que a internet, como também o mercado, é formada de nichos, o mesmo conteúdo não teria funcionado tão bem para uma marca tradicional.
Ainda na discussão do grupo, um último argumento utilizado pelos que defendem a utilização da linguagem livre em ambientes pessoais, foi o de que é preciso – necessariamente – que a empresa entenda os limites da vida profissional e pessoal do colaborador. O reconhecimento das capacidades, habilidades e comprometimento do candidato deve acontecer imparcialmente, independentemente da forma como ele prefere de comunicar via twitter, blog, youtube ou qualquer outro ambiente na internet. A instituição que não vê esse limite, no caso, seria aquela com a conduta imprópria.
Estamos em 2012, na era das memes, das hashtags, do lingerie day, dos virais e do internetês. O controle sobre a forma como um assunto reverbera nas nuvens é uma ilusão já quase morta. A boa e velha etiqueta, aquela comentada lá no começo, não é tão amplamente conhecida e compartilhada quanto os quadros do “Willy Wonka irônico”, do Facebook. Mas, apesar de tantas justificativas, o que pensar de um candidato a uma vaga de emprego que envia, junto com sua inscrição, um caminho direto para seus comportamentos mais desagradáveis? Que marca anunciaria orgulhosamente uma equipe composta por pessoas descontroladas, exageradas e grosseiras?
Mesmo aqui no futuro, para se safar do mau comportamento, só sendo genial ou essencial. O mundo não está assim tão liberal.